Não é só de conteúdo atualizado, professores competentes e infraestrutura que se faz um bom curso universitário. Cada vez mais, escolas de ensino superior têm se preocupado em garantir à formação elementos mais subjetivos, e nem por isso menos importantes: as chamadas competências socioemocionais. Facilidade para comunicação, resiliência, capacidade de trabalho em equipe e criatividade se tornaram uma preocupação central para alguns professores e coordenadores. Essa transformação está diretamente relacionada às exigências do mercado de trabalho.
“Antes, um curso de graduação, com currículo mais antigo, era muito focado em disciplinas, matérias, conteúdo”, conta o professor de Administração do Insper Guilherme Martins, para quem esse aspecto da formação já é considerado básico – afinal, muito já está disponível na internet, em plataformas de ensino online. “Dificilmente uma instituição consegue se diferenciar pelo conteúdo, o desafio das universidades hoje é como aproveitar o aluno em sala de aula para avançar no conteúdo. Talvez a parte básica ele consiga aprender fora e sozinho. E aí eu preciso trabalhar aspectos mais avançados do conteúdo e aspectos socioemocionais.”
Caminhos e carreiras
Especialistas citam várias formas de estimular o desenvolvimento dessas habilidades. Durante as aulas, isso é feito com apresentações, estudos de caso e trabalhos em grupo, para incentivar a interação entre os estudantes. Há também a preocupação em desenvolver essas competências com atividades extracurriculares, muitas vezes organizadas pelo próprios alunos em entidades estudantis.
Foi o que incentivou o estudante do 5.º semestre de Engenharia Mecânica Thiago Carletti, de 20 anos, a se envolver em atividades mais criativas. Carletti foi um dos primeiros alunos a participar do Design Challenge, uma entidade estudantil focada em implementar projetos de iniciativa acadêmica – e, em meio ao planejamento, desenvolver habilidades como resolução de problemas, organização e até empatia. A entidade nasceu em meio ao pré-vestibular da instituição, para mostrar como a faculdade pode implementar uma metodologia focada em “pôr a mão na massa”, como os alunos dizem. Muitas ideias que surgiram na fase de seleção se materializaram.
Um exemplo é o TechEdu, um dos projetos da entidade, que leva os alunos de Engenharia do Insper para dar aulas focadas em tecnologia, inovação e empreendedorismo para alunos do ensino básico, geralmente em escolas públicas. “A entidade tem esse foco de dar oportunidade ao aluno de criar o que ele quiser, dentro ou fora da faculdade”, explica Carletti.
Vestibular
A preocupação com as habilidades socioemocionais não está só no ensino e na extensão acadêmica, e influencia também a seleção de alunos no vestibular. Nos últimos anos, instituições como a Fundação Getúlio Vargas (FGV), Ibmec e Albert Einstein incluíram entrevistas e dinâmicas de grupo em seus processos seletivos. O objetivo é avaliar características como empatia e capacidade de argumentação – nos três casos, esse processo faz parte da segunda fase do vestibular.
No próximo vestibular do Ibmec de São Paulo, por exemplo, a faculdade fará uma dinâmica de grupo em que os candidatos devem propor a solução de um problema real. A ideia é que o exame reproduza técnicas usadas por empresas para recrutar colaboradores. Na nota final no vestibular, a dinâmica representa 30%, e o restante será determinado por uma prova tradicional.
“Temos formatado os cursos de graduação para que, desde o primeiro semestre, o aluno comece a se apropriar de ferramentas que serão fundamentais para que tome o protagonismo do seu futuro, e isso começa com protagonismo no estudo”, diz o professor do curso de Economia do Ibmec, João Ricardo Costa Filho. “Uma faculdade não pode preparar apenas um aluno para resolver exercícios de um livro-texto, tem de estimulá-lo a fazer boas perguntas, acostumá-lo a lidar com o imprevisto e com a busca pela melhor solução para as mais diferentes situações.”
Fonte: O Estado de S.Paulo